Que outras consequências se extraem desse cenário? Em primeiro lugar se reatualiza a polarização que desde 2018 vem caracterizando a política brasileira. Bolsonaro e Lula aparecem como polos contrapostos em lutam pelo poder. A novidade, agora, é que em face da tragédia humanitária associada com o desempenho de Bolsonaro diante do coronavírus, a métrica da polarização se volta para a inevitável comparação de virtudes e vícios dos dois governos e, nesse sentido, apesar dos processos de Lula, o cenário de mais de 350 mil vítimas da covid-19 não deixa Bolsonaro em posição confortável.
Mas isso não é tudo. O cenário de pluralismo político, essencial para a qualidade da democracia, também é afetado. A tendência de exacerbação da polarização limita drasticamente as possibilidades de surgimento de uma alternativa que, longe dos dois polos, ofereça aos eleitores uma opção mais moderada, calcada na defesa da democracia e em propostas de prioridade à saúde, criação de empregos e o enfrentamento das desigualdades abismais da sociedade. As dificuldades, nesse sentido, aparecem em pesquisas recentes que quase não identificam os atores capazes de representar essa alternativa. Isso empobrece a competição democrática e esconde a diversidade política do País, como ocorreu 2018. Vamos deixar que isso simplesmente se repita?
* PROFESSOR SÊNIOR DO INSTITUTO DE ESTUDOS AVANÇADOS DA USP