Quem hoje vê a relação tensa entre o presidente da República Jair Bolsonaro (sem partido) e o governador de São Paulo, João Doria (PSDB) pode não se lembrar que, em 2018, os dois caminharam lado a lado. O chamado voto “bolso-dória” foi a escolha de muitos paulistas em uma dobradinha que surgia como uma “cruzada” contra a esquerda. Mas a lua de mel entre os dois foi um dos primeiros rompimentos do presidente no pós-pleito.
Hoje eles se colocam de lados opostos no campo político e trocam farpas públicas constantemente. Nos últimos tempos, o maior atrito envolve o ICMS dos combustíveis. Segundo Bolsonaro, o motivo da alta no preço nas bombas é da alta incidência do imposto sob circulação, na defesa, Dória diz que o Estado de São Paulo não altera a alíquota há anos. Mas as palavras não bastam, e em um ato visando popularidade ano que vem, o tucano anunciou uma mega redução de ICMS em diversos setores, que passa a valer a partir do ano que vem e deve envolver uma cifra estimada em R$ 3 bilhões em renúncia fiscal.
Entre os contemplados com isenção ou redução do imposto estão os setores de medicamentos, veículos elétricos, veículos seminovos, sucos, logística de combustíveis e equipamentos de petróleo e gás em 2022. De acordo com Patrícia Ellen, secretária de desenvolvimento econômico de São Paulo, o crescimento do PIB paulista possibilitou que desonerações fiscais previstas para 2023 sejam aplicadas em 2022.
O anúncio das isenções, feita com pompa e com o mais alto pelotão de secretários de Doria, foi uma estratégia (eficiente, diga-se de passagem) de mostrar uma ação enquanto o presidente mantém a força de sua narrativa no discurso que acusa terceiros.
Segundo o projeto do governo do estado, os medicamentos ficarão isentos de ICMS. Já os veículos usados terão a alíquota do imposto reduzida de 3,8% para 1,8%, enquanto para os elétricos, a redução vai de 18% para 14,5%, também serão beneficiados o setor de sucos e bebidas naturais, que terá o ICMS reduzido de 13,3% para 3%, e os equipamentos de petróleo e gás, como bombas, serão isentos do imposto – hoje, o setor paga uma alíquota de 12% no tributo.
E a alfinetada ao presidente Bolsonaro, dessa vez, veio do também ex-presidencial Henrique Meirelles, que é secretário da Fazenda de Doria e já esteve na alta cúpula do governo federal no governo Lula e Temer. Segundo Meirelles, a insistência do presidente em terceirizar a culpa pela alta dos preços é para desviar a atenção dos verdadeiros fatos. “Quem sobe o preço dos combustíveis ou baixa é a Petrobras. Os estados cobram um percentual fixo de ICMS, que não mudou nada”, disse. “Inclusive tem outro aspecto que não se fala, que são todos os impostos federais que incidem no preço. É simples, sobe o preço do petróleo internacional, a Petrobras quer manter sua margem de lucro e sobe o preço”, pontuou.
Segundo o governador, foi o crescimento do PIB do estado crescendo acima da média nacional que liberou um investimento de R$ 50 bilhões em 2022, a maior cifra da história do Estado de São Paulo. “Isso não é custeio da máquina pública. É investimento direto em saúde, educação, habitação”, disse. Com os dois presidenciáveis ocupando cargos eletivos no ano que antecede a eleição, Bolsonaro insiste que o palanque o garantirá no mais alto posto da República, enquanto Doria faz de sua gestão o folder político a ser apresentado em 2022.