Utilizado diariamente por milhares de pessoas, local é referência para o turismo e para a memória afetiva de moradores
TNM/Por Jamylle Bezerra
O maior parque linear de Maceió completou 20 anos nesta semana. Situado no coração do bairro da Jatiúca, especificamente na região do Stella Maris, o Corredor Vera Arruda é hoje um sinônimo de resistência. Segue vivo e pulsante, mesmo com o ‘fantasma’ da abertura de suas ruas sempre presente.
O espaço, que conta com quase 1 km de extensão, é frequentado diariamente por pessoas de todas as idades, que procuram não só um local para diversão, lazer e prática de atividade física, mas também uma passagem segura para a praia ou para o corredor gastronômico da região. Além disso, é um ambiente tranquilo para fugir um pouco do corre-corre diário.
O professor José Queiroz de Oliveira, de 64 anos, que é presidente da Associação Comunitária dos Moradores do Loteamento Stella Maris (Astema) e reside na região há 40 anos, conta que o Corredor Vera Arruda é um espaço único na cidade, um diferencial de Maceió que, para ele, precisa ser preservado. Ele destaca que o local é frequentado não somente pelos maceioenses, mas também por turistas, que ficam encantados quando chegam lá.
“Este espaço público da cidade é diariamente usufruído por idosos, crianças, pessoas com deficiência, pequenos ambulantes e diversas entidades civis que usam o Vera Arruda para atividades culturais e recreativas. Os turistas também frequentam o corredor e, mesmo com todos os problemas, ficam encantados com o espaço”, conta o professor.
Para ele, o Vera Arruda poderia ser melhor utilizado pelos visitantes que chegam a Maceió, de forma que eles não só conhecessem o amplo espaço, mas também um pouco da história de Alagoas. “Imagine o turista começar um passeio aqui no Corredor com uma aula cultural, tratando das personalidades que foram homenageadas na época em que foi construída a primeira etapa do espaço. Depois, um banho de cultura alagoana, com homenagens às figuras do nosso folclore, e finalizando em uma missa na Igreja de São Lucas. É isso que desejamos para o nosso Vera Arruda”, diz.
O professor conta que a Astema tem atuado, de forma voluntária, em defesa do espaço, que é de todos os alagoanos. Ele pontua que a segurança do local melhorou bastante com a presença da Ronda no Bairro nos últimos anos.
Residente na região há 43 anos, a médica Maria Alice Athayde, de 77 anos, conta que viu não só o Corredor Vera Arruda nascer, mas também o Stella Maris ser povoado, com a construção de casas e dos inúmeros edifícios que existem atualmente na localidade. Ela diz que, quando chegou, havia apenas 38 imóveis por lá.
“Quando cheguei para morar, havia somente essa rua onde moro, com casas dos dois lados. Era o primeiro loteamento. Era tudo areia branca de praia, muito mato e bichos, como sapos e lagartixas. Era tudo muito esquisito, com muitos casos de assaltos. Nós tínhamos muito cuidado. Quando saía do plantão, esperava amanhecer para poder ir para casa, porque não queria arriscar. Com o tempo, foram construindo as casas, e depois teve a instalação de um PM Box, o que melhorou bastante. O Corredor Vera Arruda foi construído em etapas e, hoje, é esse espaço que vocês veem”, conta a moradora, ressaltando que faz uso diário do local, seja para caminhada, para ir até a igreja ou ao supermercado, e até para encontrar as amigas em um food truck de churrasquinho.
Para ela, o Vera Arruda significa vida. “É sinônimo de momentos de lazer. Uma área verde onde fazemos amigos e nos distraímos. É onde acontecem eventos, onde vemos famílias inteiras comemorando aniversários, promovendo encontros, fazendo ginástica e dançando. O Corredor tem vida desde as 4 horas da manhã. Primeiro, com os trabalhadores; depois, com os estudantes. É um local que não para nunca”, conta Maria Alice.
HISTÓRIA
A urbanização do Corredor Vera Arruda foi incluída no projeto de revitalização da orla marítima de Maceió no início de 2004. Até então, o local era uma área verde, dividida em dois jardins, que foram denominados, por leis municipais de 13 de junho de 1980, como Jardim Juscelino Kubitschek de Oliveira e Jardim Frei Damião de Bozzano.
O projeto paisagístico do Corredor Vera Arruda ganhou a assinatura da arquiteta Tatiane Macedo, cujos estudos foram adaptados após a então prefeita Kátia Born conseguir, junto ao Banco do Brasil, um financiamento para projetos culturais. Com a participação das arquitetas Rosa Helena Tenório, Andréa Fonseca e Mirna Porto Maia, e apoio do escultor Fred Correia, o novo projeto — focado no aspecto cultural — foi preparado.
Artistas foram chamados para colaborar e produziram esculturas, murais e painéis com perfis biográficos de personalidades alagoanas. Posteriormente, surgiu a ideia de homenagear a estilista Vera Arruda.
A empresária Bianca Tartuce, de 38 anos, é proprietária de um apartamento na região desde 2010. “Eu e minha família vivemos e curtimos intensamente momentos maravilhosos no Corredor Vera Arruda. Conseguia tirar meus filhos das telas para aproveitarem o que poucas crianças conseguem aproveitar hoje: o verde, o ar puro. Brincadeiras de criança, como bola, elástico, patinete e bicicleta. Além disso, formamos grupos de mães, nos tornamos amigas, as crianças cresceram juntas e vão levar memórias umas das outras que jamais serão esquecidas. O Corredor, para nós, é uma extensão de nossa casa”, afirma.
Para a autônoma Luciana de Barros, de 48 anos, chegou ao bairro aos 10. Ela diz que o Corredor Vera Arruda não é conhecido pela população como deveria. Falta divulgação, não só do espaço, mas também de suas potencialidades e do que as pessoas podem encontrar por lá.
“Temos missas, feiras, práticas esportivas e passeios ao ar livre. O Corredor Vera Arruda tem espaço para caminhada, pistas sinalizadas para corrida e bicicleta. Há uma igreja e um Eletroposto destinado ao carregamento de veículos elétricos. Além disso, também conta com quadras de futebol, vôlei, basquete, duas academias, espaço para uso de skates e patins, três parques infantis e dois espaços para pets”, descreve.
ABERTURA DE RUAS
No ano passado, um projeto do Departamento Municipal de Transportes e Trânsito (DMTT) previa a abertura das ruas do Vera Arruda para passagem de veículos, com o objetivo de desafogar o trânsito na região. Após mobilização da comunidade, houve um recuo, mas ninguém sabe se o projeto continua ‘vivo’.
“Esse foi o maior ataque ao Corredor nesses vinte anos, mas nós resistimos. Não sei se ainda persiste essa infeliz ideia, mas estamos preparados para tudo. Defender este espaço é a nossa missão. Enquanto o mundo caminha para criar áreas como essa que temos aqui, eles querem acabar com ela para colocar carros nas ruas”, destaca o professor Queiroz.
A reportagem entrou em contato com o DMTT para saber se o projeto de abertura das ruas do Vera Arruda continua de pé, mas não obteve resposta até o fechamento desta matéria.
Na opinião da professora aposentada Naglea Holanda, de 50 anos, não há interesse, por parte do poder público, em divulgar e investir no Vera Arruda, apesar de ele oferecer muitas opções de lazer para todos os públicos.
“Minha frequência é muito menor do que gostaria e deveria. A minha frustração foi avassaladora quando me deparei com as autoridades brigando com a população local para abrir as ruas do Corredor, alegando questões de mobilidade, numa capital que não tem plano de mobilidade urbana. Isso me adoeceu também. Fiquei triste, desmotivada e insegura. Retomei minha animação com a ação dos colegas e companheiros da Associação e dos vizinhos, que compreendem e estão se esforçando para preservar esse presente dado à população local”, concluiu.
PROPOSTAS
Neste período eleitoral, a Astema preparou um projeto que foi enviado aos candidatos a prefeito de Maceió. Entre as sugestões estão: manutenção; tombamento do espaço como patrimônio cultural; restauração das obras de arte do local; fomento a atividades culturais e inclusão do Corredor Vera Arruda no ‘Natal Luz’.
QUEM FOI VERA ARRUDA
Estilista alagoana que ganhou projeção internacional no final da década de 1990, Vera Arruda começou sua carreira confeccionando roupas e acessórios para as amigas. Depois de participar de um evento, chamou atenção pelas peças, passando a ser requisitada por grandes marcas, como Ellus e Daslu, e por celebridades brasileiras. Morreu no auge da fama, em julho de 2004, aos 38 anos, vítima de uma hepatite fulminante proveniente do tratamento de um câncer no timo.