“O governo do Brasil infelizmente não dá o menor valor à ciência”, diz pesquisador alagoano

Dr. Pedro de Lemos Menezes, da Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas (Uncisal), que em conjunto com pesquisadores da Universidade Estadual de São Paulo (UNESP) e da Universidade de Oxford, na Inglaterra, conseguiram apontar que o Brasil se projeta como próximo epicentro global da pandemia e comentou sobre outros aspectos além da pesquisa.

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Foto: Assessoria Professor Dr. Pedro de Lemos Menezes, Uncisal

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TNM/Por Daniel Paulino*

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O Cada Minuto Entrevista deste sábado (30), conversou com o professor Dr. Pedro de Lemos Menezes, da Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas (Uncisal), que em conjunto com pesquisadores da Universidade Estadual de São Paulo (UNESP) e da Universidade de Oxford, na Inglaterra, conseguiram apontar que o Brasil se projeta como próximo epicentro global da pandemia e comentou sobre outros aspectos além da pesquisa.

Questionado sobre os investimentos em ciência no país, o professor destacou que “o governo do Brasil infelizmente não dá o menor valor a ciência e ao conhecimento” e reafirmou que caso houvesse investimento nessa área, a realidade da nação em meio a pandemia, pudesse ser totalmente diferente.

O pesquisador da Uncisal destacou ainda que os investimentos começaram a cair em 2015 e de lá pra cá só tem piorado. Pedro disse em resposta a uma outra pergunta que estudos voltados para o estado de Alagoas já estão em fase final de projeto e caso seja aprovado pela universidade, poderão serem desenvolvidos no início do mês de junho.

Confira a entrevista:
01 – Quais fatores contribuíram ou contribuem para que o Brasil possa ser como próximo epicentro global da pandemia?
Uma série de fatores, um dos fatores que talvez seja o mais importante é a política de combate, então quanto mais precoce tivesse sido essa política de combate, isolamento onde deveria isolar mais e lockdwon onde deveria haver.

Quanto mais precoce fosse essa política, menos impacto teria o vírus no Brasil, inclusive contando com o fechamento de aeroportos e etc. A gente sabe que infelizmente o governo federal não acredita na política e se ele não acredita ele não propaga essa medida, que se resume aos estados, cada um com suas limitações, tão fazendo o que pode, uns mais e outros menos.

Além disso, outros fatores podem agravar, como por exemplo, favelas, onde o controle é menor, regiões que a informação não chega para as pessoas e eles acabam fazendo aglomerações, então esse conjunto de fatores acaba levando o país para esse epicentro.

Vale lembra que as ações que estão sendo desenvolvidas agora, elas só repercutem, três semanas depois, que é o tempo da pessoa entrar em contato com alguém, se contagiar, passar para outros, até que o vírus venha entrar em um estágio que é detectado, que é conhecido como a infecção, isso demora de três até mais semanas. Nosso cenário ele ainda está próximo do realista, mas ele já caminha em direção a um cenário pessimista, que aponta que no dia 9 de junho iremos atingir mais 40 mil mortos no Brasil.

02 – Em sua visão como pesquisador e que tem acompanhado a realidade de muitos países, qual o erro que a gestão pública do Brasil cometeu ou comete que se você tivesse a oportunidade, faria de maneira diferente?
Certamente, a política nacional principalmente, não falo nem as políticas estaduais, pois elas são o que nos restam, pois se não fosse elas e alguns prefeitos, nós estaríamos em uma situação muito pior.

Se a gente tivesse seguido o que o governo federal recomenda, pelo menos o que o presidente recomenda e que em meio essa pandemia, sem controle e sem liderança já demitiu dois ministros da saúde… Tudo isso acaba contribuindo para um caos. Apesar dos esforços, os estados estão atingindo um baixo isolamento social. Sim, eu faria totalmente diferente, eu teria apertado muito mais, lógico que esse tipo de medida, ela não seria única para todo o país, nós teríamos que dosar e estudar cada região.

03 – Hoje temos uma realidade de testes muito difícil em nosso país, em algumas cidades o teste acaba sendo restrito apenas para casos graves. Isso é ideal e por que?

Essa nossa condição política de direcionamento e financeira também, de não realizar o teste em todo mundo faz com que possamos ter números de infectados bastante inferiores ao número real, então isso que a gente está vendo aí são números muito distantes daquele número real.

Hoje sabemos que o cidadão só consegue fazer a testagem se for sintomático, depois de alguns dias e se estiver internado, então esse cenário caótico que não da pra gente uma certeza no número de infectados e que também não dá pra gente uma relação da fatalidade da doença, pois como a gente subnotifica os infectados e o número de mortos não tem muito como fugir, então você fica com um percentual de gente que infecta e que morre muito maior do que em outros países, pois há a subnotificação.

Se tivesse uma ação mais direta, onde qualquer desconfiança fosse teste, isolamento, seria mais fácil controlar a propagação do vírus e seria também mais fácil de abrir o comércio, então a gente acaba vendo que com esse comportamento o Brasil tá indo na contramão da reabertura.

04 – O senhor acredita que a subnotificação é muito grande em nosso país e qual o fator que faz com que essa subnotificação se perpetue?

Certamente, a gente tem algumas previsões publicadas que estimam que este número é algo em torno de dez vezes menor que o número real, então possivelmente quatro milhões de infectados, pelo menos. Isso não é só no Brasil, obviamente, em outros países também há uma certa defasagem, entretanto, a defasagem brasileira é muito maior que a de outros países, pelo fato de ter adotado a postura de realizar teste apenas em casos mais graves ou em sintomáticos.

05 – Existe uma projeção de quantos casos de Covid-19 e mortes provocadas pela doença em média o Brasil deve registrar ao fim desse “vendaval” que o país enfrenta?

Vai variar muito, um estudo recente feito pelos americanos e com algoritmo americano, aponta que teremos em torno de 120 mil mortos, mas isso é muito relativo, pois se o sistema de saúde entrar em colapso esse número pode quadruplicar, então não é possível estabelecer com precisão o número de mortos.

Se a gente estabelecer uma política de isolamento social, mais ou menos, como a gente tem hoje, esse número tende a aumentar. Temos também um histórico, que vale destacar, que em segundas ondas de outras epidemias e pandemias, a segunda onda de contaminação ela foi extremamente mais fatal, por modificações do vírus e por relaxamento maior das medidas de contenção.

06 – Como o senhor avalia o investimento em ciência e em pesquisas no país? Se houvesse um maior investimento o caso provocado pelo Covid-19 poderia ser evitado?

O nosso investimento em pesquisa é cada vez menor, gráficos mostram que o investimento em pesquisa no Brasil ao longo dos últimos anos, ele foi crescente até em média próximo ao inicio de 2015 e de lá pra cá ele só tem caído, em todos os setores que poderiam haver financiamento. Eu não falo só das bolsas, de alunos de mestrado e doutorado, mas como outras também.

Os recursos para compras de equipamento e para que possa manter a estrutura funcionando, esse sim, cada vez menores, muito menores do que os outros. Uma estrutura de pesquisa boa consegue não só prevê e reduzir impactos de situações como essas, mas também de outras questões.

O pesquisador continua pesquisando, com menos alunos, uma estrutura e equipamentos reduzidos, o que resulta em uma pesquisa muito tímida, do que ela poderia ser e do que ela poderia representar para o Brasil e para o mundo. O governo do Brasil infelizmente não dá o menor valor a ciência.

07 – Qual a leitura que o senhor faz da realidade do estado de Alagoas e como avalia nossa situação?
Não fizemos nenhuma pesquisa ou analise voltada ao estado de Alagoas ainda, esse é um projeto, já pedimos bolsa para dar avanço a esses estudos, para que possamos fazer um estudo profundo no estado, que vem também crescendo muito o número, de mortos inclusive, e a gente já tem perspectiva desse material que será desenvolvido, com a intenção de contribuir nessa guerra e em segundo momento para entendermos melhor a hidroxicloroquina nos casos mais leves, que é a única dúvida que restou, pois já se sabe, com base nos últimos estudos, que fazer o uso da medicação em casos mais graves, não ajuda, pelo contrário, só atrapalha.

Também iremos investir em um estudo para que possamos investigar a relação do uso da hidroxicloroquina em relação a perca auditiva, pois há muita informação sobre isso, quando ela era aplicada nos casos de lúpus e malária.

Por fim, também estamos planejando um outro trabalho, para avaliar aqui em Alagoas, como ficou a audição destas pessoas que fizeram esse tratamento com a hidroxicloroquina, depois da alta, pois há relatos que as pessoas perdem de maneira momentânea a audição durante a infecção e agora iremos monitorar depois do tratamento.
*Sob supervisão da editoria

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