“Ele ainda não decidiu, mas está bem entusiasmado. Vê como uma oportunidade de ajudar a distensionar o país”, diz a fonte.

A quem olha com estranheza uma chapa Lula-Alckmin, os dois lados alegam que ambos sempre tiveram um bom relacionamento, já trocaram elogios públicos e nutrem respeito mútuo.

“Ele gosta de Lula, não seria nenhum peso para ele”, diz a fonte amiga do ex-governador.

“De fato a relação deles pessoal é boa, sempre foi. Não tem boi na linha, não tem passivo. As diferenças de posição são notórias, mas não geraram passivo”, diz um outro ex-ministro que hoje faz parte do núcleo próximo a Lula.

A união civilizada de opostos políticos é apontado pelo consultor de risco Creomar de Souza, da Dharma Political Risk, como um ponto positivo para a aliança.

“Em todas as duas vitórias de Lula, ele estava em um chapa com um vice mais à centro-direita. José Alencar era esse ator à época. E Lula parece ter compreendido de maneira muito firme a necessidade de ter alguém que possa diminuir algumas ansiedades que o petismo provoca em setores mais conservadores e tradicionais da sociedade”, disse Creomar.

Ao mesmo tempo, existe resistência dentro do próprio PT, ainda assustado com o fantasma de Michel Temer (MDB), vice de Dilma Rousseff, que atuou ativamente pelo impeachment da presidente.

“Creio que a grande questão é a diminuição de resistências entre a militância. A fórmula Dilma-Temer deixou uma tensão entre vários membros do partido acerca deste tipo de arranjo e me parece que esse componente interno é o maior obstáculo neste processo”, avaliou Creomar.

Entre os petistas ouvidos pela Reuters, a versão oficial é de que Lula é o candidato e ele quem escolhe seu vice –o que não impede algumas das várias tendências do partido de vociferarem contra Alckmin. Um membro histórico do partido diz que o ex-governador traz uma “simbologia ruim” e que não acrescenta nada –ao contrário, só tiraria.

“Temos que ter programas para convencer as pessoas que vale a pena sair da pasmaceira e votar na expectativa de mudança. Por isso que não pode ser o Alckmin. Ele vai concordar com os projetos do PT, depois de tudo?”, duvida esse petista.

Do lado dos aliados do ex-governador, a pressão também é grande. Parte do grupo paulista que sempre foi mais alckmista que tucano –e hoje já está ou se encaminha para o PSD, apontado como outro possível destino de Alckmin– quer vê-lo candidato a governador e reclama que é impossível qualquer associação com o PT.

O amigo do ex-governador afirma, no entanto, que Alckmin foi muito bem acolhido no PT e as resistências estão sendo pacificadas.

“Os radicais dos dois lados são sempre um problema, mas esse é um aceno para grande parte do eleitorado que prefere um país mais pacífico, que é um eleitor médio que quer trabalhar em paz”, afirma.

BENEFÍCIO SIMBÓLICO

Em 2018, mesmo com o apoio de nove partidos –incluindo praticamente todo o centrão, que esteve nos governos Lula e agora está com Bolsonaro–, Alckmin teve apenas 4,76% dos votos.

Pesquisas feitas pelo PSB, partido ao qual o governador deve se filiar se, de fato, fechar um acordo com o PT, apontam que sua participação na chapa poderia aumentar em 4 pontos percentuais os eleitores de Lula no Estado de São Paulo –um número que entusiasmou o partido mas não é exatamente decisivo para o petista que, com mais de 40% das intenções de voto nas pesquisas, hoje ganharia a eleição em qualquer cenário.

Na semana passada, uma pesquisa nacional Genial/Quaest apresentou questões sobre uma possível chapa entre os dois ex-rivais. A maioria dos ouvidos, 64%, dizem que a união não aumenta nem diminui sua intenção de votar em Lula. Para 12%, aumenta, mas para 13%, diminui.

Entre aqueles que preferem a vitória de Lula, 65% dizem que não faz diferença, mas 20% dizem que a chance de votar no petista aumenta com Alckmin na chapa, ao passo que 10% afirmam que diminui.

Já entre os que preferem que nem Lula nem o presidente Jair Bolsonaro vençam a eleição, 67% dizem que não faz diferença, 17% que diminui a chance de votar em Lula com Alckmin na chapa, enquanto 7% dizem que aumenta.

“Alckmin vai agregar 3%? Não é isso, é uma questão simbólica”, diz um dos petistas próximos ao ex-presidente.

“As pessoas estão preocupadas com governo. Lula vai governar com o centrão ou vai procurar uma turma nova? Isso sinaliza que vai procurar uma turma nova. A gente não vai ter 300 deputados petistas. Como não vai, a sinalização é de que eu vou procurar outra turma, um arejamento da máquina pública para não cair exatamente nas armadilhas dos nossos governos.”

Desde que todas as conversas sobre a aliança começaram a surgir, Lula e Alckmin não se encontraram pessoalmente nenhuma vez. Todas as idas e vindas foram feitas por aliados indicados pelos dois. Um jantar estava marcado para a última sexta-feira para finalmente colocá-los frente a frente, mas foi adiado depois de ter vazado.

Ainda assim, a aposta é que uma decisão não deve demorar, mesmo que oficialmente não seja anunciada. Lula só pretende se apresentar como candidato formalmente –e aí ter sua chapa– em março de 2022, e Alckmin não precisa escolher um partido antes de abril do ano que vem.

Até lá, o ex-presidente tem nas mãos uma negociação delicada, em que o PSB, mesmo já tendo acertado a aliança extraoficialmente, pede a cabeça de chapa em cinco Estados, incluindo São Paulo –nesse, caso, o ex-prefeito Fernando Haddad, em segundo lugar nas pesquisas, teria que ceder a vaga para Márcio França, que está em quarto lugar, o que o PT já avisou que não fará.

No entanto, ninguém aposta que o PSB trocará uma vice-presidência, mesmo com um novato no partido, pela possibilidade distante de um governo de São Paulo.