O poema mais lindo sobre flores: leia e se apaixone

No universo encantado da literatura brasileira, Gonçalves Dias trabalha com uma maestria em seus textos sobre a vida, natureza e amor.
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No universo encantado da literatura brasileira, Gonçalves Dias trabalha com uma maestria em seus textos sobre a vida, natureza e amor.

Com um poema intitulado “As Flores”, o escritor explora não apenas a beleza efêmera das flores, mas também sua simbologia na trajetória humana. Descubra a seguir o quanto esse poema é emocionante.

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O poema mais lindo sobre flores: leia e se apaixone. (Imagens: iStock)

Poema “As Flores” de Gonçalves Dias

Tu que com tanto afã, com tanto custo,
Estudando, inquirindo, e meditando,
De estranhos climas transplantaste aos nossos
As flores várias no matiz, nas formas,
Modesto horticultor, dos teus desvelos
Este só galardão recebe ao menos!
Recebe-o: também eu gosto das flores,
Folgo também de as ver num campo estreito
De estranhas terras revelando os mimos
E as galas doutros céus: — aqui perfumam
Nossos jardins de peregrina essência!

Melhoram-se talvez, que as não contristam
Raios tíbios do sol, nem turvos ares,
Nem do inverno o furor lhes cresta o brilho.
Meigas flores gentis, quem vos não ama?
Em vós inspirações o bardo encontra,
Devaneios de amor a ingênua virgem,
À abelha o mel, a humanidade encantos,
Odores, nutrição, bálsamo e cores.
Meigas flores gentis, quem vos não ama?

Linda virgem no albor da vida incerta,
No meio das vivaces companheiras,
Em forma de capela as vai tecendo
Para cingir com ela a fronte e a coma,
Que os anos no passar não enrugaram,
Nem as cans da velhice embranqueceram.

Resplendor de inocência, onde casados
A açucena, e os jasmins aos brancos lírios
Um só perfume grato aos céus envia;
Meiga coroa de angélica pureza,
Ornamento da vida — que se rompe
Ou quando os membros delicados vestem
O grosseiro burel da penitencia,
Ou do noivado as galas! — lá se acaba,
Por fim aos pés do tálamo ou num tumulo!
Meigas flores gentis, quem vos não ama?

Quantas vezes, nas horas da ventura,
A falaz sensação dum peito ingrato
Não julgamos eterna, imensa, infinda!
Ali nossos anelos se concentram,
Nossa vida ali jaz: — cifra-se inteira
Num brando volver d’olhos, num acento,
Que a ternura repassa, inspira, exala!

Um gemido, um suspiro, um ai, um gesto,
Valem tronos e mais, — o mundo e a vida!
Mas esvai-se a paixão!… que fica? Apenas
Um saudoso lembrar de eras passadas,
De cismadas venturas não fruídas,
Às vezes uma flor!… — Flor dos amores,
Quando extinta a paixão, porque inda existes?
Espinhos de uma rosa emurchecida
Porque sobreviveis às folhas dela?

Mais firme, mais leal, mais vivedoura
Que a volúvel paixão, a flor mimosa
Talvez irrita a dor, talvez a acalma.
Emblemas do prazer, do sofrimento,
Mensageiras do amor ou da saudade,
Meigas flores gentis, quem vos não ama?

Geme a fresca odalisca entre ferrolhos,
Importuna presença a voz lhe tolhe
Do não piedoso eunuco; — a estátua negra
Respeitosa e cruel lhe espreita os gestos:
Chora a gusla mourisca ao som dos ferros,
Lastima-se a cadeia ao som dos passos,
E a humana flor definha entre outras flores;
Mil ouvidos a voz lhe escutam sempre,
E cingidos de ferro, crus soldados
De entorno ao mesto harém velam sanhudos!
Ruge, fero soldam! — treplica os bronzes
Da masmorra cruel: — a planta humilde,
A escrava que recatas tão cioso,
Zomba dos feros teus! Muda e singela
Através das prisões, dos teus soldados,
Passa a modesta flor! Vai noutro peito,
Mistérios não sabidos relatando,
Contar do infausto amor as provas duras,
Os martírios da ausência, as tristes lágrimas
Que chora — ao reiterar protestos novos!
Bem-fadadas do sol, do amor benquista,
O orvalho as cria, as lágrimas as murcham:
Meigas flores gentis quem vos não ama?

Quem tem o coração a amar propenso,
Quem sente a interna voz que dentro fala,
Delicado sentir dum brando peito,
Alma virgem que os homens não mancharam,
Quem sofre ou tem prazer, ou ama, ou espera
E vive e sente a vida, esse vos ama:
Encantos da existência em quanto vivos,
Do revés, do triunfo companheiras
No berço, no dossel, no mudo esquife,
Sempre amigas fiéis vos encontramos.
Meigas flores gentis, quem vos não ama?

Modesto horticultor, dos teus desvelos
Este só galardão recebe ao menos;
Paga-te sequer de ver mais bela,
Mais vaidosa, melhor, do sol na terra
A flor modesta, produção sublime
De estranhos climas transplantada ao nosso

 

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